Caminhos da eletrificação [Coluna Fernando Calmon]



Um salão discreto, focado em várias palestras e participação bastante limitada do público (6.000 visitantes) se realiza anualmente, no começo de outubro, por três dias. No entanto, já completou 15 edições. Trata-se do Veículo Elétrico Latino-Americano, em São Paulo. Este ano três dos cinco fabricantes que vendem esse tipo de automóvel no Brasil (CAOA Chery, JAC e Renault) montaram estandes. Bicicletas, patinetes e scooters, além de fornecedores de equipamentos de recarga, serviços e fabricantes de baterias, formaram o conjunto de expositores.

Sempre merecem especial atenção as baterias. Por isso, se ouviu com maior interesse o executivo suíço Julian Tanner, da empresa alemã Innolith. Ele anunciou um alcance de até 1.000 km para automóveis elétricos, com baixo risco de incêndio e alta densidade energética, sem revelar a matéria-prima utilizada. A Innolith ainda procura parceiros para iniciar a produção, sinal de que falta convencê-los sobre a viabilidade econômica.

Tanner até praticou sincericídio (suicídio por sinceridade) ao reconhecer a resistência do consumidor em sair dos carros convencionais, apesar da pressão dos governos da China e da Europa. Os problemas são recorrentes e bem conhecidos: demora em recarga, poucos eletropostos, alcance limitado, alto custo, peso, volume, durabilidade e reciclagem.


A empresa de pesquisas de opinião Ipsos divulgou o resultado de um estudo de como se poderia estimular a demanda por veículos elétricos no Brasil. Os percentuais somam mais de 100% porque os entrevistados puderam dar mais de uma resposta:

  • 35% opinaram que não há facilidade para encontrá-los no mercado
  • 33% afirmaram a dificuldade de encontrar estações de carregamento
  • 32% apontaram o alto custo geral (valor de revenda, reposição da bateria e mercado limitado)
  • 30% disseram que os modelos são muito caros
  • 29% consideraram o alcance inadequado para percorrer longas distâncias
Há também os otimistas que confiam no estudo da BloombergNEF. Esta consultoria foi citada por Raul Beck, do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações, por prever que em 2025 os carros elétricos deverão se equiparar em preço aos convencionais com ajuda dos subsídios dos governos. Há dúvidas sobre isso pois significa que a matéria-prima da bateria, o lítio, continuaria a cair de preço de forma acelerada na medida em que a demanda subiria consideravelmente. Não tem muita lógica econômica, quando se considera a Lei da Oferta e Procura.


Os híbridos também tiveram espaço no evento, embora não se classifiquem formalmente como elétricos. A Toyota e sua subsidiária de luxo Lexus foram pioneiras nesta solução que deveria representar um caminho mais prudente até se alcançar uma solução viável para as baterias. Se o motor a combustão for flex e usar etanol, as emissões de CO2 são mais baixas do que em um veículo 100% elétrico recarregado em uma rede cuja geração depender de fontes térmicas de origem fóssil ou não renováveis.

Para Miguel Fonseca, vice-presidente da Toyota, “é necessário uma visão de 360° de produto, tecnologia e infraestrutura em qualquer estratégia de eletrificação”. Não há como não concordar.

ALTA RODA

RECUPERAÇÃO do mercado interno de veículos leves e pesados perdeu um pouco de fôlego nos primeiros nove meses do ano. Ritmo de expansão caiu de 12,1% para 9,9% em relação ao mesmo período de 2018. Previsões da Anfavea para o ano cheio de 2019 foram reduzidas: vendas (mais 9,1%), produção (mais 2%) e exportação (menos 33%) em razão do forte tombo argentino.

ESTOQUES nos pátios das fábricas e concessionárias continuam a subir. De agosto para setembro passaram de 44 para 45 dias, mas tudo indica que começarão a cair neste último trimestre em razão de juros menores de financiamento e aquecimento tradicional de fim de ano. Normal seria estocar 35 dias de vendas. Então há espaço para continuar a negociar descontos.


JETTA GLI é um sedã impressionante a cada vez que se exige dele: basta selecionar pela alavanca de câmbio e na tela multimídia a posição Sport. Os 230 cv e os 35,7 kgfm (a apenas 1,500 rpm) não deixam dúvidas. Ao mesmo tempo oferece conforto – banco do motorista elétrico – e acabamento coerente à proposta. Além de ótimo porta-malas de 510 litros.

ALGUMAS exigências descabidas, que só aumentam custos de produção no Brasil, começam a desaparecer. Anfavea convenceu o governo a revogar antiga ação burocrática que colocava sob controle do Exército a importação de cintos com pré-tensionador e airbags. De fato, tais equipamentos contêm pequenas cargas pirotécnicas, mas nada a merecer controle rígido.

CAMPANHAS de recall passam a ser mais efetivas. Desde março de 2011 se previa que a informação sobre não atendimento estaria no certificado de registro anual dos veículos. Só agora começou a valer. As fabricantes deverão fornecer um comprovante para quem perdeu o prazo, mas efetivou o conserto. No ano seguinte, a ressalva será retirada do certificado.


Fernando Calmon (fernando@calmon.jor.br), jornalista especializado desde 1967, engenheiro, palestrante e consultor em assuntos técnicos e de mercado nas áreas automobilística e  de comunicação. Sua coluna automobilística semanal Alta Roda começou em 1º de maio de 1999. É publicada em uma rede nacional de 98 jornais, sites e revistas. É, ainda, correspondente no Brasil do site just-auto (Inglaterra).

Comentários