No recente Salão do Automóvel de Tóquio não foram apenas modelos autônomos e futurísticos que roubaram a cena. O governo japonês se empenha em disseminar a ideia da era do hidrogênio e nada como os carros para dar partida a uma verdadeira aposta. Esse elemento químico é o mais abundante do universo e está presente na água (H2O) que representa 70% da Terra.
Uma nova “sociedade baseada no hidrogênio” será difícil de florescer. Para obtê-lo a partir da água é preciso eletricidade em grande escala. Se esta vier de fontes fósseis ou não renováveis – como na maior parte do mundo – o balanço final é negativo em termos de emissões de CO2 e do temido efeito estufa. Mas se pode obtê-lo também de biogás de esgoto ou lixo.
A pilha a hidrogênio para gerar eletricidade a bordo seria boa solução para carros elétricos, pois emite apenas vapor d’água. Permite tempo de abastecimento e autonomia semelhantes aos combustíveis líquidos, ocupa menos espaço e é mais leve e fácil de reciclar.
Incentivada pelo governo do Japão, a Toyota desistiu de esperar pela evolução das baterias. Em 2015 passou a fabricar em pequena série e vender apenas no seu país o Mirai, com estética de certa forma discutível por ousar demais. A produção, de 700 unidades no primeiro ano, subirá para 3.000 em 2017, contando com exportações para EUA e Europa. Até os Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020, o fabricante esperar ver 12.000 carros circulando no Japão e 30.000 no mundo.
O preço do Mirai, pouco maior que um Camry, é bem elevado: US$ 70.000 (R$ 280.000). Mas pelo menos 25% desse valor terá subsídio governamental. Mas onde abastecer? Há uma meta de abrir 100 postos no Japão até março próximo, mas cada um custa lá US$ 4 milhões (R$ 16 milhões), 15 vezes mais que um convencional. Apenas 80 estarão inaugurados, quase todos dentro de instituições públicas e privadas.
A Honda aproveitou o Salão para apresentar a versão definitiva do seu elétrico com pilha a hidrogênio, o Clarity. Chamados de FCX Clarity, 50 carros rodam em quatro cidades da Califórnia, EUA, desde 2008, em leasing por se tratar de unidades experimentais de propriedade do fabricante. Ela perdeu a corrida para oferecer o primeiro automóvel específico fabricado em série no mundo, pois só estará à venda em março próximo, inicialmente no Japão.
Este modelo, do mesmo porte do Mirai porém mais elegante, tem autonomia de 700 quilômetros, superior à do rival. O conjunto pilha e motor elétrico ocupa volume um terço menor que no FCX, equivalente a um motor V-6 convencional. Isso permitiu colocá-lo sob o capô e liberou espaço no habitáculo para cinco adultos e porta-malas mais amplo. A Honda desenvolveu um container transportável para produzir hidrogênio e um conversor para o Clarity fornecer energia elétrica a uma casa ou de forma emergencial.
Grandes fabricantes mundiais também desenvolvem pilhas a hidrogênio há mais de uma década. A Hyundai tem um Tucson adaptado à venda nos EUA. Alguns ainda não consideram a tecnologia suficientemente madura para justificar um modelo específico, como Mirai ou Clarity. O tempo dirá quem, de fato, está certo.
Fernando Calmon (fernando@calmon.jor.br), jornalista especializado desde 1967, engenheiro, palestrante e consultor em assuntos técnicos e de mercado nas áreas automobilística e de comunicação. Sua coluna automobilística semanal Alta Roda começou em 1º de maio de 1999. É publicada em uma rede nacional de 98 jornais, sites e revistas. É, ainda, correspondente no Brasil do site just-auto (Inglaterra).
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