Paciência recompensada


A concessionária do futuro está mais próxima do que se imagina. Durante um século o ato de vender um carro pouco evoluiu: salão de venda espaçoso, vários veículos expostos e uma equipe de vendedores solícitos com calhamaços de catálogos, folhetos e tabelas de preços.

No final de 2013 a Audi inaugurou em Londres a primeira de uma rede de lojas onde a informática passou a ter mais importância e espaço do que veículos em exposição. Essa tendência, em princípio atraente para marcas premium, é chamada de varejo misto, entre instalações convencionais e de recursos on line (clicks and bricks, em inglês). Havia a expectativa de que marcas generalistas ainda demorassem um pouco a aderir.


Mas no Salão do Automóvel de Genebra, em março último, o conceito semelhante Ford Store foi apresentado no estande da empresa. Já em abril a primeira concessionária foi inaugurada em Barcelona, Espanha, de um total de 40 previstas naquele país. Objetivo é facilitar ao máximo a vida dos clientes depois de pesquisas apontarem que 80% deles chegam hoje às concessionárias com ideia exata do que desejam comprar e da configuração do modelo escolhido.

Interessante o fato de não exigir custosas reformas nas lojas. Nada de quebrar paredes ou erguer biombos. O leiaute parece bastante com a Apple Store: uma grande mesa central com vários tabletes e telas táteis ou convencionais espalhadas por ambientes em que estão alguns modelos expostos. Não há estantes de leitura de impressos, nem escaninhos, mas uns folhetos aqui ou ali ainda existem para quem gosta ou deseja levar.


O cliente que configurou seu carro em casa ou no escritório já vai encontrar tudo disponível e recuperar seus arquivos por senha. Se preferir, 50 poderosos aplicativos ajudarão nessa tarefa por meio de equipamentos robustos. Um deles utiliza geolocalização e basta se aproximar do carro exposto para o tablete mostrar alternativas de rodas, interiores, materiais e cores disponíveis. Uma tela de parede de 50 pol facilita a demonstração por imagens e vídeos de várias características dos automóveis modernos como estacionamento automático, controle ativo de cruzeiro ou sistemas de infotretenimento e conectividade.

Graças a esse suporte pode-se repassar uma massa de informações de forma simples e rápida. O cliente tem menos a ouvir do vendedor e, por outro lado, está pronto e deseja interagir com objetividade. Resta maior tempo para tratativas finais de preço, financiamento e prazo de entrega.

No entanto, há distinções entre compradores europeus e brasileiros. Aqueles se importam menos com a demora no processo de configurar e só depois produzir o carro. Tanto que há menor exigência de imobilizar capital em estoques. No Brasil, como nos EUA, os clientes são imediatistas. Não apreciam prazos industriais obrigatoriamente longos pela complexidade de opções e, por fim, acabam por pagar mais pela necessidade de estoques elevados para atender diferentes desejos dos clientes.

Esse cenário tende a se alterar. Na Europa, por razões culturais, se avança com mais rapidez na informatização do processo comercial. Tudo indica que aqui os hábitos podem mudar e se caminhe para a convergência de soluções. Em especial se houver vantagem financeira para quem tem paciência de esperar.

Fernando Calmon (fernando@calmon.jor.br), jornalista especializado desde 1967, engenheiro, palestrante e consultor em assuntos técnicos e de mercado nas áreas automobilística e de comunicação. Sua coluna automobilística semanal Alta Roda começou em 1º de maio de 1999. É publicada em uma rede nacional de 98 jornais, sites e revistas. É, ainda, correspondente no Brasil do site just-auto (Inglaterra).

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