Até o início dos anos '90, era muito comum que as pick-ups realmente direcionadas ao trabalho pesado tivessem a carroceria original metálica substituída por uma de madeira, considerada mais durável por não enferrujar e menos propensa a danos causados durante as operações de carga e descarga. A não-intrusão das caixas de roda no assoalho interno também era apontada como vantagem, facilitando a acomodação da carga, e ainda liberava espaço para a montagem de compartimentos protegidos para pequenos volumes como ferramentas ou mantimentos para uma viagem mais longa.
Até se vê uma ou outra pick-up antiga usada para serviço pesado com a carroceria original, como essa Chevrolet C-10 de um comerciante de antiguidades de Porto Alegre, mas é exceção. Embora as carrocerias metálicas sejam muito apreciadas por quem tem adotado esses modelos para uso recreacional, ainda é muito comum encontrar outras tantas ainda no batente com uma de madeira.
Até mesmo algumas pick-ups relativamente recentes como a Chevrolet S-10 e a Peugeot 504 tem recebido a carroceria de madeira, mais prática que tentar manter a carroceria original intacta em condições de uso severas. Vale destacar que os bedliners (protetores de caçamba) de plástico hoje tão populares tem o inconveniente de permitir o acúmulo de umidade e sujeira nas frestas, e poucos são os que lembram de removê-los periodicamente para uma limpeza adequada, fazendo com que possa enferrujar mais facilmente. Já a madeira pode ser tratada uma única vez e permanecer com uma durabilidade praticamente indefinida mesmo com uma rotina de manutenção menos constante.
Desde a década de '90, com a reabertura do mercado e a chegada de utilitários importados oferecidos com carroceria metálica de piso plano direto de fábrica como o Hyundai H-100 Porter e o Mercedes-Benz MB 180-D parecia que a madeira iria perder espaço. De fato a carroceria metálica ganhou apreciadores por ser um pouco mais leve, diminuindo o peso morto e aumentando a capacidade de carga, mas a madeira ainda tem seu público cativo, ainda que cada vez mais escasso.
Um caso no mínimo curioso é o das Mahindra PikUp: enquanto a versão de cabine dupla manteve a carroceria metálica original, a de cabine simples passou a ser oferecida apenas no chassi, logo a madeira se destacou como uma alternativa, considerando que a facilidade em se trabalhar com esse material acaba sendo atrativa para diminuir o custo inicial.
Há ainda quem aprecie a carroceria de madeira por reforçar a aparência de robustez em uma pick-up, levando em conta uma maior identificação com os caminhões, embora hoje seja menos comum na cidade enquanto no interior ainda podem ser vistas com facilidade.
Durante muito tempo a carroceria aberta de madeira prevaleceu não apenas em pick-ups, mas também em caminhões destinados a operações de carga seca, ou "carga geral", mas atualmente a hegemonia dos baús de alumínio é incontestável, pesando a favor não apenas a maior proteção contra a ação do tempo mas também a maior facilidade em implementar dispositivos para prevenir o furto simples em meio à onda da violência que vem assolando o país, e tendo nos caminhoneiros um volume considerável de vítimas.
Mesmo quando a carroceria aberta se faz necessária, como em caminhões com guindaste tipo "munck", a carroceria aberta de madeira está perdendo popularidade, com uma expansão do alumínio estampado também nessa aplicação.
Nas carrocerias para transporte de botijões de gás já faz algum tempo que a madeira foi quase totalmente abolida, em alguns casos permanecendo apenas no assoalho por resistir mais a arranhões que deixariam uma chapa metálica mais exposta a elementos corrosivos.
As carrocerias de madeira andam um tanto desprestigiadas, tanto por preconceitos quanto a esse material considerado menos "nobre" que o metal ou a fibra, quanto por considerações referentes ao manejo florestal e normas ambientais terem encarecido demais as madeiras "de lei", e já não conta mais com tanta popularidade apesar de alternativas como o eucalipto autoclavado serem oferecidas...
Sobre o autor
Daniel Girald, gaúcho de Porto Alegre, mais conhecido como Kamikaze, estudante de Engenharia Mecânica com alguma experiência anterior em mecânica automotiva e de motocicletas, contribuindo no Auto REALIDADE quinzenalmente (na primeira e na terceira sextas-feiras de cada mês) para abordar temas técnicos escolhidos mediante sugestões de leitores, ou aleatoriamente entre as novidades mais destacadas no mercado como na estréia da coluna. Defensor ferrenho da liberação do uso de motores a diesel em veículos de qualquer espécie.
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